Caracterizado pelo esgotamento profissional, o distúrbio também pode acometer jovens que buscam se especializar em um esporte de forma precoce. Veja dicas para evitar o transtorno
A síndrome de burnout é um distúrbio psíquico que atinge 33 milhões de brasileiros, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Caracterizado por esgotamento, ansiedade e depressão, é uma reação ao estresse causado pelo trabalho, e tem preocupado pesquisadores inseridos no meio esportivo. Na vida profissional, é comum ter que lidar com cobranças de superiores, horas extras indesejadas, insatisfação e estresse. Essa realidade também é facilmente aplicada a jovens atletas, que costumam ser expostos até o limite pelo desejo de profissionalização.
De acordo com um estudo recente de revisão publicado pelo Journal of Athletic Training, se especializar em um esporte nem sempre é melhor para o atleta em início de carreira, sobretudo quando o assunto é bem-estar mental e social. Isso porque a pesquisa aponta para o isolamento social desses esportistas, além do aumento do estresse e da falta de tempo para a família.
A síndrome é consequência da organização social, que promove o ingresso de crianças e adolescentes em um modelo de envolvimento em esporte altamente competitivo. Como a experiência de vida do jovem atleta se resume quase totalmente a sua vida esportiva, ele vive em função do esporte competitivo e cujo círculo de amizades está restrito a esse meio. Essa realidade leva a uma baixa autonomia do atleta, que fica dependente das decisões de seus pais, treinadores e dirigentes – explica o educador físico Daniel Alvarez Pires, doutor em Ciências do Esporte, professor na Universidade Federal do Pará (UFPA) e um dos autores do estudo “A Síndrome de Burnout no esporte brasileiro”, publicado em 2013 na Revista de Educação Física da Universidade Estadual de Maringá (UEM).
Principais sintomas da síndrome de burnout
Segundo a psicóloga Marisa Lúcia de Mello Santiago, especialista em psicologia do esporte e também uma das autoras do estudo, junto com Daniel, a síndrome de burnout pode aparecer em três formas: física (como a falta de apetite), psicológica (ansiedade e irritabilidade) e comportamental (dificuldade de concentração e isolamento). Há ainda uma mistura dos três tipos de sintomas. Veja abaixo como identificá-los:
Físicos
Falta de apetite;
Cansaço;
Insônia;
Gastrite;
Úlceras.
Psicológicos
Ansiedade;
Irritabilidade;
Depressão;
Frustração.
Comportamentais
Falta de flexibilidade para lidar com dificuldades do cotidiano;
Hostilidade;
Dificuldade de concentração;
Aumento de conflitos;
Falta de vontade de ir ao trabalho;
Vontade de fazer longas pausas de descanso;
Apatia em relação ao técnico e ao clube, no caso de atletas;
Isolamento;
Exaustão emocional.
Daniel Alvarez Pires esclarece que, no contexto esportivo, o burnout apresenta ainda sobrecarga em relação aos treinos, falta de progresso no desempenho atlético e desvalorização do esporte. Há uma insatisfação relacionada à habilidade e destreza esportiva, que pode resultar em falta de progressos no desempenho atlético
– O burnout apresenta exaustão física e emocional, em que há uma sobrecarga associada às demandas de treinos, viagens e competições, o que reduz o senso de realização esportiva. Além disso, o atleta pode alcançar o estágio de desvalorização esportiva, quando para de se preocupar com o seu rendimento e com o seu envolvimento dentro do meio esportivo – explica Daniel.
Como evitar a síndrome de burnout em jovens atletas?
Especialistas defendem que os jovens atletas, especialmente as crianças, devem evitar o aprofundamento prematuro e buscar a formação multilateral, com a prática de diversas modalidades esportivas. Para a psicóloga do esporte Simone Salvador Gomes, as pessoas têm apostado cada vez mais no precoce, o que pode atrapalhar o desenvolvimento psicológico e social do esportista.
– A especialização esportiva é quando a criança pratica, sistematicamente, uma única modalidade, objetivando o aprimoramento técnico dos fundamentos, o conhecimento tático e o desenvolvimento das capacidades físicas necessárias para o êxito na categoria específica. Quando adicionamos o termo precoce à especialização esportiva, significa que as crianças estão se tornando especializadas em uma única modalidade mais cedo do que a idade apropriada. Isso pode influenciar negativamente o desenvolvimento físico, psicológico e social da criança – ensina Gomes.
Daniel também defende a prática de diversas modalidades esportivas na fase infantojuvenil.
– A formação esportiva multilateral é mais recomendada que a especialização precoce, pois promove a diversificação do repertório motor e favorece a escolha da modalidade na qual o jovem atleta irá se especializar – analisa Daniel Alvarez Pires.
A psicóloga Marisa Lúcia de Mello Santiago afirma que outra opção para evitar a síndrome em atletas é apostar em estratégias de coping, que são mecanismos de enfrentamento)em relação a situações de cobrança, dano ou ameaça, e inovar para tornar as atividades mais prazerosas.
– Ter que lidar com cobrança de família, técnico e clubes não é fácil. Na formação da criança, o importante é o treino ser prazeroso, o técnico tem que trazer isso de uma maneira lúdica. É importante destacar que todos que estão envolvidos com os atletas podem contribuir pela prevenção do burnout, como diversificar o treino e desenvolver estratégias de coping que possam ajudar, como, por exemplo, tocar um instrumento, mas isso varia de acordo com o estilo de cada atleta – declara Marisa.
Dicas para prevenir o burnout
Com base nas orientações da psicóloga Simone Salvador Gomes, o Eu Atleta preparou cinco dicas simples para exercer no dia a dia, e que podem ajudar você a evitar a síndrome de burnout. Confira:
Cobre-se menos. Um dos motivos que levam à síndrome do burnout é uma cobrança excessiva, procure então não se cobrar tanto. Foque na satisfação em melhorar e ter a percepção do desenvolvimento, independentemente dos resultados nas competições;
Alimente-se de forma adequada. A alimentação correta e balanceada permitirá a ingestão adequada de nutrientes para seu dia a dia. Eles te ajudarão a repor as energias e, sendo assim, você se sentirá mais preparado para sua rotina;
Lembre-se que o descanso faz parte do processo de treinamento;
Tenha momentos de lazer e relaxamento. Eles são fundamentais para descansar a mente e o corpo e interagir com as pessoas a sua volta;
Converse com seu treinador, com seus familiares e amigos. Fale sobre suas emoções;
Encare os treinos e as competições como momentos alegres, pois isso vai lhe proporcionar satisfação em treinar cada vez mais e melhor, para expandir seu potencial físico e psicológico. A história esportiva nos mostra que esse é um grande diferencial dos grandes atletas, que quando percebem tensões, desgaste e aflições, encontram alegria e divertimento para competir;
Não force uma especialização precoce da criança. Deixe-a praticar várias modalidades esportivas, para que possa desenvolver diversas habilidades motoras e escolher aquela que mais a agrada.
Tratamento
No caso de a síndrome já está em estágio avançado, você vai precisar de ajuda profissional. A psicoterapia é sempre a mais indicada. O psicólogo ou psicoterapeuta pode ajudar a encontrar estratégias para aliviar o estresse, a ansiedade e a depressão, que incluirão mudanças de hábitos do dia a dia. Em casos mais graves, pode também indicar um psiquiatra, para tratamento com medicação, através de antidepressivos ou ansiolíticos.