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Os reais benefícios da vitamina D

A vitamina D vem sendo pauta em diversas áreas da medicina. De fato, ela tem sua importância quando estamos falando de saúde e metabolismo ósseo, onde atua como parte de um mecanismo complexo de interações para o adequado metabolismo do cálcio.

Seu papel primordial é na absorção intestinal de cálcio e fósforo e reabsorção óssea (ou seja, promovendo a saída do cálcio dos ossos para a circulação sanguínea). A vitamina D é sintetizada em etapas, onde inicialmente seu precursor na pele, o 7-Dehidrocolesterol, sofre ação dos raios UVB.

Em seguida, ela passa pelo primeiro processo de hidroxilação no fígado, se tornando a 25-OH-Vitamina D (forma que é dosada e mais abundante) e uma proporção milesimal sofre a segunda hidroxilação a nível renal, se tornando a 1,25-OH-Vitamina D, o calcitriol, forma ativa.

Deficiência de vitamina D: adultos jovens assintomáticos devem ser rastreados?

Lembrando que ela também pode ser ingerida a partir de fontes animais, onde assim como quando produzida no organismo humano, recebe o nome de colecalciferol (D3). Quando é proveniente de fontes vegetais ou fungos, recebe o nome de ergocalciferol (D2).

Tudo isso com o objetivo de manter a homeostase do cálcio. Mesmo na saúde óssea, seu papel é controverso e não 100% esclarecido.

Sabemos por exemplo que a vitamina D em níveis subótimos pode ser causa de hiperparatireoidismo secundário, e em situações extremas, quando associada a calciopenia (por exemplo, numa doença disabsortiva grave ou pós cirurgia bariátrica), pode causar osteomalácia.

Também é conhecido seu papel fundamental na causa e tratamento de formas do raquitismo, como por exemplo, quando há defeito em sua síntese.

Quem deve dosar a vitamina D e porque?

O papel bem estabelecido da vitamina D está intimamente relacionado à saúde óssea. Desta forma, as indicações mais claras de sua dosagem devem ter relação justamente esse objetivo, tendo em mente populações de risco para doenças osteometabólicas ou risco para sua deficiência, como por exemplo:

  • Idosos
  • Mulheres pós menopausa
  • Menopausa precoce
  • Doenças do metabolismo ósseo (ex: hiperparatireoidismo primário, osteoporose, etc)
  • Doença renal crônica
  • Negros e populações institucionalizadas
  • Doenças disabsortivas
  • Pós cirurgias disabsortivas (Ex: bariátrica)
  • Doenças crônicas de pele
  • Pessoas em uso de anticonvulsivantes, colestiramina, anti retrovirais, glicocorticoides, cetoconazol

Ainda existe muita controvérsia quanto a uma indicação um pouco mais abrangente, especialmente ao se discutir qual seria o objetivo de uma possível reposição.

Mas então, qual é a polêmica da vitamina D?
Não apenas no Brasil, mas mundo afora se tem interesse em entender se a vitamina D poderia trazer benefícios além da saúde óssea. É sabido que a vitamina D não age apenas no metabolismo ósseo, mas sim em diversos órgãos e sistemas, o que instiga tanto quem pesquisa como os pacientes a buscar informações.

Infelizmente, no entanto, a maioria dos dados encontrados são confusos e embasados em estudos observacionais, sem associação causal ou com problemas metodológicos, mas mesmo assim condutas são tomadas sem haver de fato evidência de benefícios quanto a desfechos clínicos na reposição.

Tendo em vista tais pontos, foi publicado em fevereiro de 2022 na Nature Endocrine Reviews uma excelente revisão sobre esse assunto: a suplementação da vitamina D e as evidências de estudos em humanos.

Como o assunto é extenso e valeu uma breve revisão para introdução, separamos este assunto em dois tópicos diferentes. Neste texto, abordaremos os efeitos da vitamina D no diabetes e no câncer. Em um próximo, veremos os dados referentes a outras condições.

Diabetes tipo 2

Grandes ensaios clínicos randomizados (RCTs) foram realizados entre 2017 e 2020 com intuito de avaliar os benefícios na suplementação de vitamina D sobretudo em doenças oncológicas e cardiovasculares.

Com relação ao DM2, o maior RCT realizado foi o D2d, que avaliou o efeito da reposição de vitamina D (4000 UI/dia) no risco de progressão do pré DM para DM. Não houve benefício estatisticamente significativo na reposição da vitamina D com este intuito (HR 0,88; IC 95%, 0,75 – 1,04, P = 0,12).

Em análise Post hoc, houve um efeito significativo em indivíduos com IMC < 30 kg/m², indo de acordo com duas metanálises que indicavam o mesmo efeito (uma redução de cerca de 10% do risco de evolução para DM em pacientes não obesos), muito menores que o já recomendado (mudança no estilo de vida e metformina).

A conclusão é que talvez exista algum benefício, porém ínfimo, nessa situação específica. Lembrando que os estudos observacionais trazem uma associação entre baixos níveis de vitamina D e DM, bem como diversas das condições discutidas na revisão, como no câncer e nas doenças cardiovasculares.

Câncer

Estudos pré-clínicos demonstram que a vitamina D tem um papel na regulação do ciclo celular e vários estudos observacionais também relacionam a depleção da vitamina D e incidência aumentada de câncer ou pior prognóstico.

Estudos de randomização mendeliana* não observaram maior incidência de câncer em indivíduos geneticamente predispostos a baixas concentrações de vitamina D.

Os RCTs de intervenção não são animadores. O maior estudo, o VITAL, não encontrou benefícios na suplementação de vitamina D na incidência de câncer durante um follow up de 5,3 anos, nos EUA (HR 0,96, IC 95%, 0,88 – 1,06).

O mesmo resultado negativo foi visto em outro grande RCT neozelandês, o ViDA trial. Vale destacar que ambos estudos selecionaram uma população já com níveis normais de vitamina D, ou seja, não abordaram pessoas depletadas ou com deficiência grave.

Curiosamente, quanto à mortalidade, uma metanálise da Cochrane mostrou uma redução modesta (RR 0,88, IC 95%, 0,78 – 0,98) em um follow up médio de 6,3 anos, na dose de 1,146U/dia. No mesmo VITAL trial citado acima, houve uma tendência a redução, porém não significativa. Já no ViDA, nenhuma mudança foi observada, mas vale destacar que o follow up foi mais curto, menor que quatro anos.

A conclusão é que não é possível descartar algum mínimo benefício neste cenário, mas considerando o longo prazo onde talvez esse efeito aconteça, será muito difícil comprovar a eficácia com esse objetivo.

*Estudo de randomização mendeliana é um método genético que busca avaliar se polimorfismos estão associados com a incidência de uma doença. Neste caso, são selecionados polimorfismos – single nucleotide polymorphisms (SNPs) – associados a menores níveis séricos de vitamina D, selecionando portanto populações com níveis menores de vitamina D. Esses SNPs podem explicar cerca de 2 a 10% da variação.

No próximo tópico, será abordado assuntos como doenças cardiovasculares, covid-19, doenças pulmonares, autoimunes e conclusões sobre o assunto. Não deixe de acessar!

 

 

Fonte: Portal PEBMED

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