Alguns, como bulimia ou anorexia, são conhecidos. Já outros (vigorexia, pregorexia…) passam despercebidos. Veja como identificar transtornos alimentares
Tare
Sigla para transtorno alimentar restritivo evitativo. É o quadro típico de crianças que se recusam a comer um grupo alimentar específico por motivos que vão de aparência e cor a odor, textura, temperatura e paladar. Há quem não experimente nada que seja amarelo, outros fogem de purês e papas, um terceiro grupo evita frutas e verduras, e assim por diante.
Claro que todo mundo tem suas manias e preferências nos primeiros anos de vida, mas deve-se ligar um sinal de alerta quando essa restrição impede o consumo de nutrientes essenciais, que impactam o desenvolvimento infantil e podem levar a déficits importantes.
Recentemente, um jovem britânico de 17 anos vítima de Tare perdeu a visão porque só se alimentava de batata frita e pão branco. A ausência de vitaminas e minerais em sua dieta foi tão grave que lesou o nervo óptico, responsável por captar e transmitir os estímulos de luz do ambiente ao cérebro.
Ruminação
O sujeito regurgita um pouco do que comeu na última refeição e mastiga novamente. Parte dos portadores cospe o conteúdo, enquanto outra parcela engole uma segunda vez. Esse processo se repete praticamente todos os dias e não está relacionado a nenhuma outra condição médica, como o refluxo gastroesofágico.
Se comparado com o vômito provocado na bulimia, o volume de alimentos que volta à boca é pequeno, o que permite disfarçar a ruminação por meio de tosses e outras táticas. Esse quadro foi descrito em bebês, crianças, adolescentes e até adultos de 20 a 30 anos.
Além da saúde mental, o transtorno traz outras consequências ao organismo: a ida constante de ácidos estomacais para o esôfago, a garganta e a cavidade bucal provoca úlceras, mau hálito e cáries. Muitos sofrem uma perda de peso rápida e desenvolvem outros incômodos, caso de náuseas, constipação ou diarreia.
Pica
Em latim, pica é o nome de um pássaro muito comum em parte da Europa. Esse bicho come praticamente qualquer coisa. Os sujeitos com essa síndrome apresentam um comportamento parecido: eles ingerem itens que não são considerados alimentos de verdade, como moedas, terra, argila, carvão, tecidos… Além disso, entram na descrição os casos de quem engole ingredientes sem nenhum preparo, como farinhas e batatas cruas.
É normal que crianças pequenas levem à boca muitos desses objetos, pois estão explorando o mundo à sua volta. A situação fica séria quando isso vira um hábito e perdura por três meses ou mais.
O transtorno, também conhecido pelo nome de alotriofagia ou alotriogeusia, se distingue de costumes locais: alguns povos originários da África e das Américas experimentavam terra e outros elementos estranhos ao paladar em rituais e cerimônias religiosas.
Ortorexia
Pizza sexta à noite? Nem pensar! Uma sobremesa no almoço de domingo? Pecado mortal. A ortorexia, que ainda não é um transtorno alimentar reconhecido por toda a comunidade científica, vem da junção dos termos gregos “orexis” (apetite) e “orthos” (correto). O que pega aqui é a obsessão por alimentos saudáveis, puros e naturais.
O quadro, descrito há 22 anos pelo médico americano Steven Bratman, costuma aparecer em mulheres de classes sociais mais abastadas, bem como em pessoas com traços de perfeccionismo e que se cobram muito. A questão não está nas calorias de cada prato, mas, sim, na pureza dos produtos.
O quadro pode gerar grande sofrimento emocional, pois o indivíduo geralmente se recusa a comer algo que não foi preparado por ele mesmo, e também leva a um isolamento social, já que muitos evitam refeições ou confraternizações e festas.
Vigorexia
“Esse não é um transtorno alimentar clássico, mas, sim, uma dismorfia corporal que tem uma ligação com as fobias”, define o psiquiatra Adriano Segal, da Associação Brasileira para o Estudo da Obesidade e da Síndrome Metabólica.
A obsessão aqui está na ideia de um corpo perfeito, com músculos fortes e torneados. Diferentemente dos tipos sobre os quais já falamos, a vigorexia é mais comum em homens jovens que se submetem a uma rotina exaustiva e exagerada de exercícios físicos.
Em paralelo aos treinos na academia, muitos também criam neuras com a comida: só comem frango com batata-doce ou acham que suplementos proteicos são suficientes para se manterem de pé.
Há ainda um grupo que aposta pesado em anabolizantes e outras substâncias proibidas para alcançar o resultado — e eles nunca estão satisfeitos e querem sempre aumentar o tamanho do peitoral, dos braços e das pernas.
Diabulimia
Eis outra condição descrita nas últimas décadas que ainda não entrou oficialmente no grupo dos transtornos alimentares. A diabulimia é a junção de diabetes com bulimia.
Vamos voltar alguns passos para explicar direito essa história: diabéticos apresentam falhas na ação da insulina, um hormônio secretado pelo pâncreas. Por uma série de motivos, a substância não consegue mais fazer a glicose virar combustível para as células.
Resumo da ópera: sobra açúcar na circulação. Para equilibrar essa equação, alguns pacientes precisam aplicar todos os dias doses de insulina. “Mas quem tem a diabulimia deixa de tomar de propósito o medicamento com o objetivo de perder peso”, conceitua Christina de Almeida dos Santos.
Essa decisão, porém, é pra lá de arriscada: o desbalanço nas taxas de açúcar traz graves consequências, como hipoglicemias e comprometimentos nos rins, nos olhos, no coração…
Drunkorexia
Esse transtorno, divulgado pela primeira vez num artigo em 2008, já foi declarado um problema de saúde pública na Austrália, especialmente em mulheres universitárias jovens. Em inglês, “drunk” significa bêbado. A drunkorexia seria, então, o hábito de substituir a comida por bebidas como uma maneira de inibir o apetite e, assim, emagrecer. O consumo de doses é alto: são cinco ou seis drinques em menos de duas horas.
O álcool ainda tem outro papel por aqui: ele aplaca a ansiedade e o nervosismo, deixando o sujeito inebriado e sem focar em suas preocupações. Quem é acometido por essa condição desenvolve outros comportamentos típicos da anorexia ou da bulimia, como a indução de vômitos e o uso compulsivo de medicamentos.
O abuso etílico leva à dependência química, à falta crônica de nutrientes importantes obtidos por meio da dieta convencional e provoca lesões em órgãos como o fígado.
Fatorexia
A empresária britânica Sara Bird, de 53 anos, ficou assustada quando foi a um consultório e o médico fez o diagnóstico de obesidade. Sem se pesar havia muitos anos, não tinha notado que ganhara 30 quilos.
“Quando me olhava no espelho, via uma pessoa confiante, magra, mas na verdade estava obesa”, contou, numa entrevista à BBC Brasil em 2010. Foi daí que ela cunhou o termo fatorexia — “fat”, em inglês, significa gordura.
Desde então, Sara publicou livros, fez palestras e iniciou um movimento nas redes sociais para que o distúrbio fosse reconhecido pelos manuais de psiquiatria. Em suma, esse transtorno seria o inverso da anorexia.
“O sujeito não se enxerga gordo, mesmo com todas as mudanças no tamanho de roupas e medidas corporais”, observa Fátima Vasconcellos. Para piorar, ele persiste em hábitos nocivos à saúde e não vê motivos para procurar apoio profissional.
Pregorexia
Não é isso que você está pensando: ninguém está comendo pregos por aí para ficar com a barriga chapada — assim esperamos, pelo menos. “O ‘preg’ no início da palavra vem de ‘pregnancy’, ou gravidez, no bom português”, ensina Christina.
O conceito é super-recente e abrange qualquer transtorno alimentar que ocorra ao longo dos nove meses de gestação. Pode ser anorexia, bulimia, compulsão alimentar, ortorexia… “Muitas das mulheres ficam extremamente preocupadas com a questão do peso e da alimentação durante esse período e acabam caindo em armadilhas, como dietas restritivas, indução de vômitos ou atividades esportivas intensas”, complementa a expert.
A prática, claro, traz muitas encrencas: aborto espontâneo e dificuldades no desenvolvimento do bebê são algumas delas. Para evitar qualquer risco, tenha sempre uma conversa franca e tire todas as suas dúvidas com o obstetra.
Fonte: Alimentacao Abril