Um artigo recente do jornal americano The New York Times trouxe dados alarmantes sobre o consumo de remédios pelos idosos daquele país: pessoas entre 65 e 69 anos tomam em média 15 medicamentos com prescrição por ano e o grupo de 80 a 84 anos chega a 18 medicações com receita.
Na conta, não entram vitaminas e outros produtos que não requerem uma indicação médica. Os dados são da American Society of Consultant Pharmacists (ou Sociedade Americana de Farmacêuticos Consultores). Seria, segundo o Times, outra epidemia de drogas de uso legal e que geralmente ocorre às escondidas nos Estados Unidos, como é caso da de opioides, indicados para controlar a dor. A diferença é que, nessa última, a parcela da população acometida pelo problema é de jovens adultos.
Voltando aos idosos, no Brasil, apesar de não haver estatísticas recentes sobre essa situação, o panorama não é muito diferente, de acordo com a geriatra Thais Ioshimoto, do Hospital Israelita Albert Einstein. Mas existem peculiaridades nacionais. “Nos Estados Unidos, algumas coisas são mais restritas. Aqui, consegue-se comprar muitos remédios sem receita”, diz. Sem falar na cultura dos medicamentos considerados naturais, dos chás e das ervas. “Eles podem interferir na medicação”, avisa Thais. Em outras palavras, anulam ou potencializam o efeito de outra droga utilizada concomitantemente.
Depois dos 65 anos, há uma maior incidência de problemas crônicos, que muitas vezes se sobrepõem, assim como as respectivas drogas para tratá-los, explica o geriatra Renato Bandeira de Mello, diretor científico da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia. Entre alguns dos remédios mais usados pelo público dessa faixa etária estão antihipertensivos, analgésicos, estatinas para controlar os níveis de colesterol, drogas para a diabetes e, dependendo do caso, ansiolíticos para quem enfrenta problemas para dormir – entre indivíduos mais velhos, eles aumentam o risco de quedas.
Além disso, a maioria dos idosos brasileiros não tem um médico de família ou geriatra para passar, por assim dizer, um pente fino na lista de medicamentos. “Pedimos para trazer a sacola de remédios”, conta a geriatra Thais Ioshimoto. Isso porque o paciente às vezes se consulta com especialistas de áreas diversas que não necessariamente se comunicam ou que não perguntam sobre os demais itens medicamentosos. Muitas vezes porque a consulta é rápida. E o paciente nem sempre diz o que está tomando. “É uma falha de comunicação de duas vias”, diz Bandeira de Mello, também professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Daí, existe o risco de dois medicamentos serem indicados para o mesmo problema. Há também a possibilidade de interação entre uma droga e outra, como no caso das ervas e afins. No Hospital das Clínicas de Porto Alegre, uma equipe multidisciplinar formada por médico, enfermeiro e farmacêutico clínico atende os idosos. “Eles tendem a ser mais honestos com os farmacêuticos”, revela. Não contam tudo para o profissional de jaleco branco com medo de deixá-lo chateado ou com receio de serem cobrados.
Outra situação que pode ocorrer é a chamada cascata iatrogênica. É quando, por exemplo, um médico indica um anti-inflamatório que pode atacar o estômago. Em seguida, receita-se outra droga para debelar esse efeito colateral. E assim por diante. “Recomenda-se fazer uma análise do medicamento. Se houver opções, pode-se optar por outros”, diz Bandeira de Mello. “O mais importante é pensar na qualidade da prescrição: o medicamento certo, na hora certa e no momento certo com acompanhamento e reavaliação.”
Outro perigo é o uso de remédios que não precisam de receita, os OTC, e suplementos. “O consumo de cápsulas de ômega-3 pode potencializar a ação de anticoagulantes”, exemplifica Thais Ioshimoto. Ela relata também casos de intoxicação por ingestão além da conta de vitamina D. “Qualquer medicamento ou vitamina têm suas indicações”, fala Bandeira de Mello. “Há mais risco quando não se têm claro os benefícios de seu uso.”
Fonte (Yahoo.com.br – Agência Einstein)