Mais comum em adultos, a urticária crônica pode ocorrer em crianças. O correto diagnóstico evita confusão com outras reações alérgicas.
Recentemente, a revista médica Journal of Allergy and Clinical Immunology publicou os destaques sobre urticária crônica espontânea (UCE) a partir da atualização mais recente do consenso sobre definição, classificação, diagnóstico e manejo das urticárias.
Mais de 50 sociedades médicas ao redor do mundo, incluindo a Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (ASBAI) e a Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD) participaram do documento, que foi publicado em março de 2022.
Urticária é um grupo heterogêneo de doenças inflamatórias que pode ter caráter agudo ou crônico, induzido ou espontâneo e cuja etiologia pode ser alérgica ou não. É caracterizada pelo surgimento de urticas, angioedema ou ambos associada a prurido.
Apesar de ser mais comum em adultos, as urticárias crônicas podem ocorrer em crianças e não raramente causam grande confusão, sendo tratadas como reações alérgicas, o que pode gerar exames desnecessários e restrições inadvertidas.
Metodologia
Foram nomeados especialistas provenientes de 50 sociedades médicas, sendo selecionadas 23 questões a serem abordadas. Os autores realizaram uma revisão da literatura a partir de dois revisores independentes. A partir disso, 21 estudos foram incluídos e as recomendações foram submetidas a uma avaliação de nível de qualidade de evidência pelo método GRADE.
As recomendações foram analisadas por mais de 250 especialistas em uma conferência Delphi que ocorreu em Berlin no ano de 2020, sendo necessário pelo menos 75% de concordância entre os especialistas para que a recomendação fosse incluída no consenso.
Recomendações com 90% ou mais de concordância foram consideradas “consenso forte”, enquanto aquelas entre 75 e 89% foram consideradas “consenso”.
Resultados
A definição de urticária, a divisão entre aguda (< 6 semanas) e crônica (> 6 semanas) e o entendimento de que a doença pode ter o angioedema como única manifestação seguem inalteradas. No entanto, a publicação enfatiza a importância de investigar outros diagnósticos nesses casos, como o angioedema mediado por bradicinina.
O novo consenso ratifica a importância do acompanhamento dos pacientes com urticária crônica a partir de questionários, não somente de atividade da doença, mas também de qualidade de vida e controle da doença. Inclusive, é sugerido embasar o tratamento nestes questionários, especialmente o de controle da doença.
É importante notar que, assim como as versões anteriores, não se recomenda a realização de nenhum tipo de exame complementar na investigação da urticária aguda. Por outro lado, está indicada uma avaliação mais cuidadosa nos casos de UCE com objetivos de excluir diagnósticos diferenciais, identificar condições capazes de modificar a atividade da doença, avaliar os preditores de seu curso e monitorar suas complicações e atividade.
Para tal, sugere-se história e exame físico detalhados, hemograma completo, proteína C reativa (PCR) e/ou velocidade de hemossedimentação (VHS), além de imunoglobulina (Ig)E total e IgG anti-tireoperoxidade (TPO).
Estas duas últimas dosagens auxiliam na investigação de UCE de etiologia autoimune, hipótese que se reforça quando há níveis baixos de IgE e níveis elevados de IgG anti-TPO. O teste do soro autólogo serve o mesmo propósito. A depender destes dados, outros exames podem ser solicitados.
O consenso destaca que houve algumas mudanças relacionadas ao tratamento farmacológico da UCE havendo, atualmente, 3 steps de tratamento: primeira linha (anti-histamínicos), segunda linha (omalizumabe) e terceira linha (ciclosporina). Também foram feitas ressalvas sobre a necessidade eventual de ajuste de dose do omalizumabee em casos selecionados, especialmente em pacientes com índice de massa corporal (IMC) alto.
O consenso também sugere a abordagem “tanto quanto necessário e o mínimo possível” na avaliação de step up e step down do tratamento com anti-histamínicos, ratificando a possibilidade de uso de doses até quatro vezes a usual para controle da doença.
Conclusão
Além de ser uma doença relativamente frequente, a UCE traz grande prejuízo de qualidade de vida e significativa carga econômico para os sistemas de saúde. Dessa forma, é importante que os médicos responsáveis por estes pacientes estejam cientes sobre o que há de mais atual sobre o diagnóstico e manejo da doença.
Mensagem final
As urticárias, especialmente aquelas com caráter crônico e espontâneo, são um grande desafio para o médico, além de serem causa importante de ansiedade e prejuízo de qualidade de vida para o paciente.
Apesar do surgimento e maior disponibilidade de tratamentos para a doença nos últimos anos, especialmente dos imunobiológicos, ainda são necessários estudos para melhor compreender os mecanismos preponderantes nos diferentes subtipos da doença.
A possibilidade de revisão e criação de um consenso a partir de um grupo tão rico que conta com os maiores especialistas no assunto mundialmente é extremamente valiosa para o médico especialista e não especialista que lida com estes pacientes.
Texto publicado originalmente em: Portal PEBMED