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Por que você não deve tomar aspirina nem ibuprofeno contra o COVID-19?

Por Dr. Mercola

Se você acompanha as notícias sobre o novo coronavírus COVID-19 (às vezes também conhecido como SARS-CoV-2, devido às semelhanças com a SARS), você provavelmente já viu artigos com informações conflitantes sobre o uso do ibuprofeno.

Alguns dizem que tomar ibuprofeno pode agravar a infecção por COVID-19, enquanto outros dizem que não existe esse risco. Em 18 de março de 2020, por exemplo, a CNN informou que o ministro da saúde da França, Oliver Veran, havia alertado contra o uso de anti-inflamatórios não esteroides (AINEs), como o ibuprofeno, para tratar a febre e a dor associadas à infecção por COVID-19 e sugeria o uso de acetaminofeno ( paracetamol).

Pontos de vista conflitantes sobre o risco do ibuprofeno

Segundo a CNN, a recomendação de Veran “foi criticada por alguns especialistas da saúde, que citaram a falta de evidências publicamente disponíveis”. Tarik Jašarević, porta-voz da Organização Mundial da Saúde, disse à CNN que está analisando o assunto, mas que uma revisão superficial da literatura não foi suficiente para produzir dados clínicos ou populacionais que sustentassem a recomendação de Veran.

Da mesma forma, o Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas dos EUA disse à NBC News que “são necessárias mais pesquisas para avaliar os relatos de que o ibuprofeno pode afetar o curso do COVID-19” e que “não há evidências de que o ibuprofeno aumente o risco de complicações graves ou de adquirir o vírus que causa o COVID-19”.

A Agência Europeia de Medicamentos emitiu uma declaração quase idêntica. No entanto, a agência também destaca que iniciou sua revisão dos AINEs em 2019, depois que a Agência Nacional Francesa de Medicamentos e Segurança de Produtos de Saúde informou que esses medicamentos parecem piorar a infecção por varicela e algumas infecções bacterianas.

O Ministério da Saúde francês segue com a recomendação de evitar o uso de ibuprofeno, dizendo que “graves efeitos adversos” foram identificados em pacientes com suspeita ou confirmação de infecção por COVID-19 tratados com AINEs.

Em suas mais recentes diretrizes de tratamento do COVID-19, de 14 de março de 2020, o Ministério enfatizou que “o tratamento de uma febre ou dor associada ao COVID-19 ou a qualquer outra doença viral respiratória deve se dar por paracetamol”, não excedendo 60 miligramas (mg) por quilo ao dia ou 3 gramas por dia.

Embora alguns veículos de comunicação estejam descartando a recomendação de evitar o ibuprofeno como um “boato na internet” que não tem fundamentação científica, parece tolice descartar a possibilidade de imediato.

Primeiramente, se as autoridades de saúde da França dizem que a administração de AINEs a pacientes infectados está causando efeitos adversos, não seria melhor darmos ouvidos? Afinal, uma pesquisa clínica leva tempo. Portanto, prestar atenção às descobertas empíricas pode valer a pena, pelo menos até que uma pesquisa seja concluída.

Como eu, o Serviço Nacional de Saúde Britânico parece disposto a pecar pelo excesso de cautela. Em um Tweet de 18 de março de 2020, o NHS declarou: “Não há fortes evidências de que o ibuprofeno possa piorar o coronavírus. Mas até que tenhamos mais informações, tome paracetamol para tratar os sintomas do coronavírus, a menos que seu médico tenha lhe dito que o paracetamol não serve para você.”

No vídeo do MedCram acima, o Dr. Roger Seheult, analisa alguns dos benefícios e desvantagens dos AINEs. Por exemplo, embora eles demonstrem inibir a replicação viral, o que é bom, eles também interrompem a produção de anticorpos, o que é ruim quando você está combatendo um vírus altamente epidêmico. Ele também discute dados convincentes que sugerem que o amplo uso de altas dosagens de aspirina durante a pandemia de gripe de 1918 e toda a publicidade em seu favor coincidem com o aumento das mortes em outubro de 1918.

O que as comorbidades do COVID-19 podem nos dizer?

Outra fonte que aumentou o debate é a carta intitulada “Os pacientes com hipertensão e diabetes mellitus estão em maior risco de infecção por COVID-19?”, publicada no Lancet Respiratory Diseases em 11 de março de 2020.

A carta destaca que as comorbidades mais prevalentes entre os pacientes com infecção grave por COVID-19 e aqueles que morreram da infecção são: pressão alta, diabetes tipo 2, doença coronariana e doença cerebrovascular.

Um ponto comum entre todas essas condições é que elas são frequentemente tratadas com inibidores da enzima de conversão da angiotensina (ECA) – medicamentos que relaxam e dilatam os vasos sanguíneos. Infelizmente, nenhum dos três estudos que analisaram as comorbidades nos casos de COVID-19 incluiu dados sobre os medicamentos que os pacientes usavam para tratá-las.

Por falar em comorbidades, um relatório de 17 de março de 2020 do Instituto Italiano Superiore Di Sanita destaca que mais de 99% dos que morreram de COVID-19 na Itália tinham condições médicas anteriores. Isso não deve necessariamente nos surpreender, considerando que a maioria das mortes ocorreu em pessoas com mais de 80 anos.

A idade média de infecção na Itália é de 63 anos. Cerca da metade dos que morreram tinha três ou mais condições médicas anteriores, enquanto a outra metade tinha uma ou duas. Das 2.003 mortes relatadas, apenas três não tinham histórico médico anterior.

O mecanismo de ação proposto

Então, o que os inibidores da ECA têm a ver com COVID-19? O problema, de acordo com os autores dessa carta do Lancet, é que os inibidores da ECA aumentam a expressão da ACE2, e o COVID-19 infecta as células hospedeiras pela ligação aos receptores ACE2 encontrados nas células epiteliais dos pulmões, intestinos, rins e vasos sanguíneos.

Como tal, os inibidores da ECA podem potencialmente piorar o risco de infecção por COVID-19 e o risco de complicações. Os autores observam que o ibuprofeno também pode aumentar a ACE2, razão pela qual pode não ser uma má ideia a recomendação de evitar o ibuprofeno se você tiver sintomas de COVID-19.

Em uma nota paralela relevante, sabe-se que o ibuprofeno interage mal com os medicamentos inibidores da ECA. Portanto, geralmente é aconselhado que os pacientes que tomam inibidores da ECA tomem acetaminofeno, de qualquer maneira, para evitar problemas renais agudos.

De acordo com os autores da carta do Lancet, Lei Fang e Michael Roth (Pesquisa em Células Pulmonares e Pneumologia, Hospital Universitário de Basileia, Suíça) e George Karakiulakis (Departamento de Farmacologia, Faculdade de Medicina da Universidade Aristóteles de Thessaloniki, na Grécia):

“Os coronavírus patogênicos humanos (coronavírus da síndrome respiratória aguda grave [SARS-CoV] e SARS-CoV-2) se ligam às células-alvo através da enzima conversora de angiotensina 2 (ACE2)…

A expressão da ACE2 é substancialmente maior em pacientes com diabetes tipo 1 ou tipo 2, que são tratados com inibidores da ECA e bloqueadores dos receptores da angiotensina II tipo I (BRA).

A hipertensão também é tratada com inibidores da ECA e BRA, o que resulta no aumento da ECA2. A ACE2 também pode ser aumentada pelas tiazolidinedionas e pelo ibuprofeno.

Esses dados sugerem que a expressão da ACE2 aumenta no diabetes, e o tratamento com inibidores da ECA e BRA aumenta a expressão da ACE2. Consequentemente, o aumento da expressão de ACE2 facilitaria a infecção por COVID-19.

Portanto, supomos que o tratamento do diabetes e da hipertensão com medicamentos estimulantes da ECA2 aumente o risco de desenvolver um caso grave e fatal de COVID-19…

Um outro aspecto que deve ser investigado é a predisposição genética para um risco maior de infecção por SARS-CoV-2, que pode se dever a polimorfismos da ECA2 que foram associados ao diabetes mellitus, acidente vascular cerebral e hipertensão…”

A febre é uma parte importante da sua defesa imunológica

Há também uma razão completamente diferente para evitar os AINEs — assim como outros antipiréticos (redutores de febre) — quando você está com febre, e isso tem a ver com o fato de que a febre faz parte da resposta imunológica do seu corpo. É assim que seu corpo mata os patógenos.

Essa é uma das razões pelas quais incentivo fortemente o uso da sauna, pois aumentar regularmente a temperatura corporal central ajuda a prevenir infecções.

O aumento da temperatura corporal central permite que os glóbulos brancos identifiquem e matem com mais eficiência as células infectadas por vírus. Tomar um medicamente de livre venda para reduzir a febre interfere nesse processo crucial e pode permitir que a infecção dure mais tempo, causando mais danos no processo.

Vários estudos analisaram esse problema, chegando à conclusão de que o tratamento da febre pode prolongar e agravar a doença. Uma alternativa melhor — desde que sua temperatura não fique perigosamente alta — é repousar bastante na cama, ingerir muitos líquidos e simplesmente “suar”. Conforme observado no documento de políticas da Academia Americana de Pediatria, “A febre e o uso de antipiréticos em crianças”:

“Muitos pais administram antipiréticos, mesmo quando a febre é baixa ou inexistente, porque preocupam-se com o fato de a criança manter uma temperatura ‘normal’. A febre, no entanto, não é a doença primária, mas um mecanismo fisiológico que tem efeitos benéficos no combate à infecção.

Não há evidências de que a própria febre agrave o curso de uma doença ou que cause complicações neurológicas a longo prazo. Assim, o objetivo principal em tratar a criança febril deve ser melhorar o conforto geral da criança, em vez de se concentrar na normalização da temperatura corporal.”

A febre tende a diminuir a mortalidade quando deixada de lado

Um estudo randomizado e controlado, publicado em 2005, descobriu que pacientes gravemente doentes que receberam acetaminofeno e mantas de resfriamento quando a febre ultrapassou 38,5ºC sofreram muito mais infecções e apresentaram uma taxa de mortalidade mais alta do que aqueles que não receberam tratamento a menos que febre atingisse 40ºC. Conforme relatado pelos autores:

Quarenta e quatro pacientes foram randomizados para o grupo agressivo e 38 pacientes foram randomizados para o grupo permissivo… Houve 131 infecções no grupo agressivo e 85 infecções no grupo permissivo.

Houve sete mortes no grupo agressivo e apenas uma morte no grupo permissivo. O estudo foi interrompido após a primeira análise interina devido à diferença de mortalidade, relacionada a questões de renúncia ao consentimento e ao mandato de risco mínimo. Conclusões: o tratamento agressivo da febre em pacientes críticos pode levar a uma maior taxa de mortalidade.”

Aqui está outra citação de um artigo de 2002, “Febre: os efeitos benéficos e prejudiciais dos antipiréticos”, publicado no Current Opinion in Infectious Diseases:

“Dados consideráveis sugerem que a febre tem um efeito benéfico no resultado de muitas infecções, embora não em todas.

Por exemplo, uma pesquisa com pacientes com pneumonia adquirida na comunidade mostrou que aqueles com temperaturas acima de 37,8ºC e uma contagem de leucócitos acima de 10.000 células/mm tinham uma taxa de mortalidade de 4%, comparada com uma taxa de mortalidade de 29% para pacientes sem febre nem leucocitose.

A sobrevida melhorada também foi demonstrada em pacientes febris com bacteremia por Escherichia coli e septicemia por Pseudomonas aeruginosa em relação a pacientes afebris… Numerosos estudos em animais mostraram uma correlação inversa entre mortalidade e temperatura durante infecções graves.

Em um desses experimentos, a taxa de sobrevivência aumentou de 0% a 50% em camundongos com peritonite por Klebsiella pneumoniae quando suas temperaturas foram aumentadas artificialmente dos níveis normais para os níveis febris.”

As proteínas de choque térmico protegem contra lesões por choque séptico

As proteínas de choque térmico aumentam com o uso de sauna.

Conforme detalhado em “Alta temperatura pode matar o coronavírus“, quando a temperatura corporal central aumenta, seja por febre ou por se estar numa sauna, as proteínas de choque térmico são ativadas, o que na verdade suprime a replicação viral.

Como observado na citação acima de “Febre: os efeitos benéficos e prejudiciais dos antipiréticos”, as proteínas de choque térmico também protegem contra a lesão oxidativa que ocorre na septicemia.

Considerando que o COVID-19 é uma infecção viral que, em casos graves, pode desencadear uma enxurrada de citocinas — a mesma coisa que ocorre na septicemia — parece razoável ter pelo menos um pouco de cautela quanto ao uso de ibuprofeno para diminuir a febre relacionada ao COVID-19.

Agora declarado como uma pandemia, o COVID-19 continua afetando a saúde das pessoas e milhares de pessoas já foram vítimas dessa doença misteriosa. Mas, à medida que o vírus se espalha rapidamente, o mesmo ocorre com as informações erradas que o cercam. Nestes tempos difíceis, você deve aprender a separar fatos e ficção para poder tomar as medidas certas para proteger sua saúde.

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FONTE: MERCOLA

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