Tráficos de drogas e armas levaram o PCC a investir em Goiás, sua nova ‘menina dos olhos’
Fumaça registrada durante rebelião no Complexo Prisional de Aparecida de Goiânia, no dia 1º; membros do PCC estão espalhados em cadeias de Goiás
As disputas entre as facções criminosas PCC (Primeiro Comando da Capital) e o CV (Comando Vermelho) estão longe de se resumir aos confrontos sangrentos pelo controle dos presídios brasileiros –o último embate resultou em nove mortes durante as rebeliões no complexo prisional de Aparecida de Goiânia, na primeira semana deste ano.
Na lógica do crime, controlar as rotas de tráfico é tão importante quanto chefiar as alas de penitenciárias. Estado localizado na região central do Brasil, essencial em termos logístico para distribuição de drogas e armamentos, Goiás tornou-se a “menina dos olhos” do PCC, que implementou uma política agressiva de arregimentação de novos membros, apurou o UOL junto a policiais civis e promotores de justiça que investigam a expansão do grupo criminoso de origem paulista nas cidades e prisões goianas.
Arte/UOL
“Dois anos atrás não tínhamos isso aqui, de PCC. Hoje 30 cadeias, 40 cadeias têm”, afirmou o governador Marconi Perillo (PSDB) à presidente do STF (Supremo Tribunal Federal) e do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), ministra Cármen Lúcia, durante reunião há uma semana para discutir a crise prisional de Goiás.
“Eles começaram a avançar pelo sudoeste do Goiás, na região de divisa com o Estado do Mato Grosso, de onde vêm pelas rodovias carregamentos de drogas como cocaína e maconha, além de armas”, explica o presidente do Sindicato de Policiais Civis, Paulo Sérgio Alves de Araújo.
“De Goiás, drogas e armas são distribuídas para Estados de todas outras regiões do país”, afirma o presidente do Sindicato de Policias Federais em Goiás, Francisco José da Silva Júnior.
Armas e celulares apreendidos no Complexo Prisional de Aparecida de Goiânia
As prisões de cidades como Jataí, Rio Verde, Maurilândia e Mineiros, no sudoeste goiano, tornaram-se palcos de uma campanha de filiação, como o PCC vem implementando em Estados que a facção considera chave para sua expansão. Exemplo disso é o Ceará, que só perde em número de filiados para São Paulo e Paraná.
“A expansão dele foi tão desenfreada que até um cabeleireiro, sem ficha criminal nem parentes no sistema prisional, foi batizado pela facção”, afirmam promotores do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) do MP (Ministério Público) de Goiás. “O PCC quer ampliar o número de filiados para ter condições de enfrentar o Comando Vermelho, que está há mais tempo estabelecido no Estado.”
Publicada no último 15 de dezembro, reportagem do UOL mostrou que o PCC afrouxou regras de batismo para aumentar o número de criminosos ligados à facção. Em Goiás, adolescentes infratores estão sendo recrutados.
Expansão identificada a partir de um celular
Agentes da Draco (Delegacia de Repressão às Ações Criminosas Organizadas) começaram a monitorar a expansão do PCC em Goiás a partir do final de 2016, após a apreensão de um celular pertencente a um membro da facção. Foram identificados 400 Imeis (número de identificação de cada telefone móvel) que estavam associados ao grupo criminoso. Com interceptações telefônicas, foi possível monitorar a movimentação de seus usuários.
A investigação aponta para 577 membros do PCC presentes em 42 das 246 cidades do Estado. As informações constam no relatório de inteligência nº 194 da Secretaria da Segurança Pública, obtido com exclusividade pelo UOL.
“A Superintendência de Inteligência Integrada, por meio da Gerência de Inteligência Estratégica, monitora e acompanha, em parceria com outras instituições, especialmente a Polícia Civil e a Superintendência Executiva de Administração Penitenciária, as facções criminosas presentes e atuantes no estado de Goiás, sendo que hoje predomina em nosso estado o Primeiro Comando da Capital – PCC que conta, segundo levantamentos, com 577 (quinhentos e setenta e sete) faccionados presos e em liberdade em diversos municípios goianos”, lê-se no documento datado de 28 de agosto passado.
Desde então, a presença da maior facção do país só aumentou em Goiás, afirma o titular da pasta, Ricardo Balestreri. “Posso dizer que os números desse grupo criminoso são maiores neste momento”, afirma. “Os relatórios de inteligência mostram que a facção está dispensando a exigência de mensalidade para novos membros com o objetivo de aumentar o número de filiados.”
Inspeção mostra buraco em prisão de Aparecida de Goiânia, em Goiás, onde houve rebelião que deixou nove mortos
Batizada de Operação Insone, a investigação da Draco resultou em 20 denúncias oferecidas à Justiça pelos promotores do Gaeco/MP-GO. Ao total, 87 membros do PCC em Goiás foram denunciados. Deste número, os 30 considerados mais perigosos foram transferidos das prisões onde se encontravam para o Núcleo de Custódia do complexo prisional de Aparecida de Goiânia, reconhecida como a mais segura unidade prisional do Estado.
As denúncias do Gaeco mostram que o PCC estabeleceu, como em outros Estados, funções e hierarquias entre seus membros que são divididas em sintonias (como são chamados os comandos da facção).
“Eles crescem na ausência do Estado. O que acontece nas favelas acontece também nas prisões. Eles estão muito mais organizados que o Estado. Você percebe que o perfil do preso vem mudando nas prisões. Os membros do PCC costumam ser articulados, diferentemente daqueles do Comando Vermelho”, diz um agente penitenciário de Goiás, sob a condição de sigilo.
“Acho que não temos ideia do que está para acontecer se as facções continuarem comandando presídios no Brasil.”
Fonte: capitan bado