Assalto a bancos de Porto Alegre, São Paulo, fugas e perseguições em estádios estão no currículo do líder do PCC morto no Tatuapé
A lista de crimes nos quais Claudio Roberto Ferreira, conhecido como Galo, suspeito de integrar a facção criminosa do PCC (Primeiro Comando da Capital) se envolveu é extensa. Não se tratam de delitos simples. Pelo contrário, são pelo menos cinco ações cinematográficas desde 2006 até sua morte, na noite da terça-feira (23), quando foi baleado com 70 tiros de fuzil no bairro do Tatuapé, na zona leste de São Paulo.
O primeiro deles ocorreu no dia 1º de setembro de 2006, em Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. A Operação Toupeira prendeu um grupo formado por 26 pessoas, entre elas, Galo e um de seus parceiros mais próximos, Carlos Antonio da Silva, conhecido como Balengo. “Tudo ocorreu em uma época em que diversas operações de roubo a banco eram realizadas na sequência”, afirma Antônio Celso dos Santos, policial federal que atuou na operação
Um plano ousado havia sido desenhado pelo grupo para assaltar a agência central do Banrisul, com uma ramificação para a Caixa Econômica Federal, localizadas a poucos metros de onde o grupo se instalou para escavar o túnel. “Muitos deles estavam com nomes falsos, na época eles compravam kits documentos, que incluíam CPF, carteira de habilitação e identidade”, diz Santos.
O túnel para assaltar o banco de Porto Alegre levou quatro meses para ser escavado. O início das investigações ocorreu em 2005, quando outro assalto a banco foi interceptado em Fortaleza. Todo o grupo atuava na escavação do túnel, inclusive Galo e Balengo, organizados por turnos. “Começamos a identificar os membros do grupo ainda no roubo de Fortaleza”, diz Santos. “O objetivo era prender e recuperar o dinheiro para que não fosse usado em outros assaltos”, afirma.
O grupo comprou um prédio de sete andares que pertencia ao INSS e ficava no centro de Porto Alegre de onde planejou suas ações. “Com a desculpa de que estavam fazendo uma reforma, movimentavam todo o material de construção necessário”, diz o policial. A investigação também identificou conversas telefônicas que citavam algum tipo de proximidade entre Balengo e Galo. “Balengo foi citado em várias conversas no Ceará e uma das lideranças de Fortaleza, conhecida como Piauí, iria para Porto Alegre. Nós o acompanhamos e começamos a montar o quebra-cabeça.”
Galo e alguns dos membros do PCC presos na Operação Toupeira
Divulgação PF
O grupo foi preso às 5h30 do dia 1º de setembro de 2006. Ambos foram transferidos para a Penitenciária de Charqueadas, no Rio Grande do Sul. Tempos depois, ele fugiu com Balengo do presídio em que cumpria pena para São Paulo.
Assaltos a bancos em São Paulo
Em 2008, uma tentativa de assalto em um banco de Guarulhos também contou com a presença de Galo. Após o roubo a uma agência bancária, Galo e Balengo teriam sido perseguidos pela polícia, quando entraram em uma casa na tentativa de fazer reféns. “O carro em que estavam perdeu o controle, entraram em uma casa e chamaram um delegado para negociar”, afirma Márcio Sérgio Christino, procurador de Justiça do MP-SP.
A tentativa de assalto não deu certo e Balengo morreu em conflito com a polícia. “Balengo era o líder da turma de assaltos a bancos e eram ligados ao PCC”, diz Cristino. “Os dois eram comparsas e pessoas extremamente violentas. Eram reconhecidos como lideranças emergentes e indivíduos perigosos, utilizados em situações de confronto”, diz o procurador.
Nessa ocasião, Galo foi preso e condenado a 65 anos de prisão por roubo, seguido de morte. Durante o confronto e a perseguição, três pessoas morreram e 12 ficaram feridas.
Após a morte de Balengo, Galo começou a organizar, de dentro do presídio, outra ação cinematográfica de roubo a banco. Em 2011, um assalto a uma agência da Avenida Paulista, centro financeiro de São Paulo, também ganhou os holofotes. Imagens de uma câmera de segurança de um estabelecimento vizinho ao banco Itaú registram o momento em que um homem vestia o uniforme de um vigia às 23h30 de um sábado.
Às 00h41 do sábado, 27 de agosto, um homem se sentou na entrada do prédio e às 2h41 outro homem de terno e gravata olhou para a câmera. Depois dessa movimentação, somente às 7h18 do dia seguinte dois policiais patrulham a região da paulista. Uma hora depois, os homens deixam a agência com joias e dinheiro.
Foram arrombados 138 cofres. Destes, 120 continham bens valiosos como joias, relógios e canetas. A polícia descobriu que 12 homens entraram no banco, tiveram tempo suficiente para pedir lanches a um comparsa que estava do lado de fora. O roubo milionário ocorreu exatamente no mesmo horário de uma competição do lutador brasileiro Anderson Silva.
Fuga, perseguição e liberdade
As tentativas de fuga continuaram. Em agosto de 2015, Galo foi preso mais uma vez em um estádio da Vila Belmiro, em Santos, enquanto assistia a um jogo entre seu time, o Corinthians, e o Santos. O fato que chamou a atenção é que ele usava uma camiseta com a estampa de Toni Montana, personagem interpretado por Al Pacino no filme Scarface, que protagoniza uma fuga.
À época, o Deic (Departamento de Investigações sobre Crime Organizado) afirmou que Galo tentou uma fuga desesperada pela torcida do Corinthians e foi contido pelos policiais antes que pulasse da arquibancada, a cerca de 10 metros do chão.
Já em 2016, o STF (Supremo Tribunal Federal), julgou um habeas corpus de Galo e decidiu que ele deveria responder a condenação de 65 anos de prisão por roubo a banco e latrocínio em liberdade. O então ministro Ricardo Lewandovski entendeu que ele só poderia ser preso depois que todos os recursos do processo fossem julgados, contrariando outra decisão da Corte de fevereiro do mesmo ano.
Baixada santista
Além de ser uma liderança no PCC na zona leste de São Paulo, região onde morreu na noite da segunda-feira (23), Galo também teria influencia no tráfico de drogas da região da baixada santista. De acordo com o promotor de Justiça do Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado) do Ministério Público de São Paulo, Lincoln Gakiya, sua morte teria sido motivada por uma disputa interna no PCC.
Segundo Gakiya, Galo teria atraído Wagninho, outra influente liderança do PCC na baixada santista, até o hotel em que morreu na zona leste de São Paulo, em fevereiro desse ano. “Desde 2006, ele se tornou uma liderança emergente, um bandido de força dentro da facção”, afirma Cristino. Ao mesmo tempo, segundo o procurador, a Baixada Santista é uma região que gera conflitos entre membros do PCC desde o início do grupo.
“Desde que o líder Sandro Henrique da Silva Santos, que dominava o tráfico na baixada, foi morto sempre houve uma disputa entre líderes do PCC pelos territórios”, afirma. A região é disputada, sobretudo, em função dos portos, que colocam a cidade de Santos em uma posição geográfica privilegiada para a exportação das drogas para outros países. “É um alvo constante de disputas.”