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Há alterações cerebrais em indivíduos pós-covid-19?

A síndrome pós-covid-19 costuma ser definida como persistência de sintomas após 3 meses da infecção por covid-19.

A síndrome pós-covid-19 tem sido frequentemente reportada nesse contexto pós-pandemia. É manifestada com sintomas neurológicos como fadiga, dor, cefaleia e queixas cognitivas.

A fadiga é caracterizada como uma experiência de fraqueza, exaustão e redução da capacidade mental e física que é desproporcional a atividade que está sendo realizada. Há metanálise recente alegando que em torno de 30% dos pacientes acometidos por covid-19 desenvolvem fadiga.

As queixas cognitivas pós-covid geralmente são avaliadas em torno de 20% dos pacientes, especialmente em idosos. Os déficits cognitivos podem acometer múltiplos domínios, como: memória episódica e de curto-prazo, atenção e linguagem.

Considerando esses dois sintomas proeminentes na síndrome pós-covid, ainda é incerto se a existência desses sintomas está associada a alterações estruturais em neuroimagem. Em 2023, foi publicado um estudo que se propõe a investigar tal associação.

Métodos

Foram recrutados 50 pacientes com sintomas neurológicos pós-covid-19 advindos de consultas ambulatoriais em clínica na Alemanha. Os critérios de inclusão foram: (1) história confirmada laboratorialmente de infecção por SARS-CoV-2 com (2) sintomas neurológicos pós infecciosos e (3) sem histórico de doença neurológica prévia.

O grupo caso foi comparado a um grupo controle saudável pareado em idade e em gênero, cujos critérios de inclusão foram (1) ausência de infecção prévia por covid-19 e (2) sem histórico de doença neurológica prévia.

O tempo de recrutamento ocorreu entre abril e dezembro de 2021. Os participantes da pesquisa foram convidados a realizar exames de ressonância magnética de crânio com avaliação volumétrica assim como testes neuropsiquiátricos.

Foi também proposto um outro grupo controle que apresentasse sintomas de fadiga moderada-grave para comparação de neuroimagens. Esse grupo foi composta pelos seguintes critérios de inclusão: (1) diagnóstico de esclerose múltipla remitente-recorrente de acordo com critérios de McDonald 2017 e (2) fadiga moderada-grave (escala de Fadigue Severity Scale ≥ 1).

Os exames de ressonância magnética foram realizados com aparelho Siemens de 64 canais 3 Tesla com análise volumétrica das imagens. Já na avaliação clínica, foram realizadas diversas escalas para mensuração de fadiga, sono e testes cognitivos.

Resultados

A amostra foi predominantemente feminina, sendo 39 de 47 participantes. Durante a visita da pesquisa, os pacientes espontaneamente reportaram sintomas, como: exaustão (39/47, 83%), esquecimento (29/47, 62%), cansaço (26/47, 55%), dificuldade em encontrar palavras (21/47, 45%), cefaleia (19/47, 40%) e sensação de estresse (17/47, 36%).

O grupo pós-covid-19 apresentou sintomas de fadiga tanto física quanto mental. Além disso, em avaliação clínica para analisar alterações de sono, humor e cognição, foi observado que o grupo com síndrome pós-covid-19 apresentou aumento nos níveis de depressão, ansiedade, sonolência diurna e problemas de sono com significância estatística ao comparar com o grupo controle.

Quanto à avaliação de imagens com análise volumétrica, o grupo com síndrome pós-covid-19 apresentou alterações – com significância estatística ao comparar com grupo controle – como deformação da superfície talâmica esquerda e redução volumétrica do putâmen esquerdo. Não foi observada alterações em núcleo accumbens ou caudado. Não foi observada alteração na integridade da substância branca cerebral.

Por fim, foi comparado as alterações estruturais cerebrais do grupo controle de esclerose múltipla com o grupo controle saudável.

No grupo de esclerose múltipla com fadiga, foi observado significância estatística em alterações com redução volumétrica em tálamo bilateral, putamen bilateral, núcleo accumbens bilateral assim como em região de caudado e de globo pálido esquerdos.

Discussão

Fadiga pós-covid-19 foi associada a distintas alterações cerebrais subcorticais detectáveis a partir de ressonância magnética de crânio nesse estudo. Esse achado acentua a importância do manejo terapêutico da síndrome pós-covid-19 cuja clínica muitas vezes incapacita os indivíduos acometidos.

As alterações em tálamo e em núcleos de base detectados nesse estudo são a primeira descrição que correlaciona com sintomas de fadiga em pacientes pós-covid-19. Os autores da publicação descrevem que uma ruptura da circuitaria dopaminérgica dos núcleos de base é que pode estar relacionada à fadiga.

O grupo controle composto por pacientes com esclerose múltipla e fadiga apresentaram alterações subcorticais mais esparsas do que o grupo caso. Os pontos de sobreposição nas alterações estruturais cerebrais podem sugerir substrato neurológico para os sintomas de fadiga presentes em ambas essas morbidades.

Mensagem final

Nesse estudo, foi demonstrado alterações talâmicas e de núcleos da base em pacientes com relato de fadiga pós-covid. Pesquisas futuras são necessárias para avaliar se os sintomas de fadiga são transitórios ou crônicos.

 

 

 

Texto publicado originalmente em: Portal PEBMED

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