Teste desenvolvido por pesquisadoras da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), chamado biópsia líquida, permite a realização do diagnóstico de forma menos invasiva
Há mais de uma década, cientistas da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) trabalham na investigação de indicadores presentes no sangue, chamados tecnicamente de biomarcadores, que podem trazer novas respostas sobre o câncer de mama.
O objetivo central da pesquisa é poder identificar doença ainda em fase inicial. O diagnóstico precoce contribui para evitar a metástase, que consiste no espalhamento das células cancerígenas para outras partes do corpo.
Um método desenvolvido pelas pesquisadoras da UFU, chamado biópsia líquida, permite a realização do diagnóstico de forma menos invasiva que em outros exames.
Na tecnologia, o sangue é coletado e passa por uma centrífuga que separa as suas partes. Em um segundo momento, são observadas as partes sanguíneas em um equipamento chamado citômetro de fluxo, que permite identificar a presença ou a ausência de células tumorais malignas ou benignas.
Os resultados do método foram publicados no periódico científico International Journal of Molecular Sciences. Ao todo, 110 mulheres contribuíram com o desenvolvimento do estudo
Inovação no diagnóstico do câncer de mama
O câncer de mama é o principal tipo de câncer a atingir mulheres, com uma estimativa de mais de 66 mil novos casos a cada ano no Brasil, segundo o Instituto Nacional de Câncer (Inca).
A mamografia é um dos principais exames para a identificação desse tipo de câncer. O Ministério da Saúde recomenda a realização do exame como método de rastreamento para o câncer de mama, ou seja, exame de rotina, para mulheres sem sinais e sintomas na faixa etária de 50 a 69 anos, a cada dois anos.
“O ultrassom das mamas é um exame de imagem que permite detectar lesões presentes nas mamas, especialmente nas mamas mais jovens e densas. Com o exame é possível visualizar nódulos, cistos, secreções nos mamilos, espessamento do tecido mamário e outras alterações. Esse exame é recomendado especialmente para mulheres jovens e gestantes, e como exame complementar a mamografia”, afirma a enfermeira Lara de Andrade Marques, que participa do estudo.
A biomédica Alinne Tatiane Faria Silva explica que as células tumorais se separam do tumor e vão para a corrente sanguínea, mesmo no início da doença, mas que ainda não há um consenso de como identificar essas células.
“Assim, a plataforma biotecnológica é um novo método que utiliza técnicas, já amplamente utilizadas em diversas pesquisas na área da saúde, com o foco na descoberta de marcadores de células tumorais, com o objetivo de melhorar o diagnóstico e o tratamento do câncer de mama, o que possibilitará a diminuição da mortalidade e morbidade das mulheres acometidas por essa doença”, diz.
Segundo a especialista, a vantagem desse novo tipo de biópsia é que ela é realizada através da coleta do sangue, “tornando-a muito mais rápida e menos invasiva do que os procedimentos realizados atualmente para o diagnóstico. Além disso, possibilita acompanhar o tratamento em tempo real”, explica.
Como foram realizados os testes
Após a coleta do sangue das mulheres, o material era centrifugado, processo que separa as suas partes. A seguir, as pesquisadoras adicionavam reagentes que marcavam as proteínas nas células tumorais e essas células eram contadas e identificadas em um equipamento chamado citômetro de fluxo.
“Dessa forma, é possível identificar a presença ou ausência de células tumorais através de um conjunto específico de proteínas, o que chamamos de painel de marcadores. Com esse método conseguimos classificar corretamente, acima de 80%, as mulheres que não apresentavam alterações na mama, mulheres diagnosticadas com doença benigna da mama e mulheres diagnosticadas com câncer de mama. Além disso, conseguimos classificar aquelas que passaram pelo tratamento e aquelas que não haviam recebido tratamento ainda”, afirma a professora Yara Cristina de Paiva Maia, coordenadora do Grupo de Pesquisa em Biologia Molecular e Nutrição (Bionut).
O estudo foi desenvolvido no Laboratório de Nanobiotecnologia Prof. Luiz Ricardo Goulart Filho da UFU e os testes foram realizados em pacientes do ambulatório de Mastologia do Hospital de Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia (HC-UFU). O método teve a patente depositada em 2020 junto ao Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI).
“Hoje temos um método para o diagnóstico e o monitoramento do tratamento de pacientes com câncer de mama, baseados na presença ou ausência das proteínas que encontramos nos nossos estudos, que ainda se encontram em fase de validação. Temos parcerias nacionais e internacionais”, diz Yara.
Próximos passos
As pesquisadoras afirmam que os biomarcadores tumorais circulantes, que são referidos como “biópsia líquida”, têm grande relevância no rastreamento precoce e não-invasivo do câncer. Segundo elas, a pesquisa pode possibilitar a detecção do câncer de mama em fases iniciais e sem causar dor às pacientes.
“Desejamos que o teste chegue o quanto antes para a população. Porém, há um caminho a ser seguido para que isso aconteça. Atualmente, contamos com a parceria de uma empresa e estamos em fase de validação dos dados, com confirmação dos resultados em um número maior de pacientes. A seguir, solicitaremos autorização das agências reguladoras para incluir a metodologia na prática clínica e poder, futuramente, ser distribuída no Sistema Único de Saúde (SUS)”, diz Yara.
As pesquisas são contínuas, sendo que neste momento os alunos investigam outros biomarcadores na corrente sanguínea. “No nosso Hospital de Clínicas, quando uma mulher é indicada para biópsia por suspeita de câncer de mama, pode ser incluída em nossa pesquisa. Assim, caso aceite participar, será acompanhada ao longo do tratamento em momentos-chave, como antes e após cirurgias”, conclui.
– Texto originalmente publicado em CNN News