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sábado, novembro 23, 2024

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Apendicite aguda: como diagnosticar com poucos recursos?

O diagnóstico de apendicite aguda, na prática, é diferente daquilo que lemos nos livros.

O quadro de apendicite aguda é a emergência cirúrgica abdominal mais comum, envolvendo ambos os sexos e tem sua distribuição semelhante pelas diferentes faixas etárias. No entanto, realizar o diagnóstico de apendicite, pode em diversas situações, ser complicado devido as diferentes apresentações que esta patologia possui.

Modernamente o uso de exames de imagem, agregam elementos ao raciocínio clínico, e auxiliam em muito o diagnóstico de apendicite aguda. Uma tomografia computadorizada (TC) característica de apendicite aguda praticamente sela o diagnóstico e poucos casos a história clínica será capaz de contrariar este achado tomográfico.  A utilização da TC está tão relacionada aos casos de apendicite que muitos esquecemos dos recursos básicos para auxiliar e até mesmo selar o diagnóstico correto.

Para chegar ao final com um diagnóstico correto, o início também deve ser correto
Não é demasiado repetir que para um bom raciocínio diagnóstico, devemos coletar uma boa história clínica do paciente. Todos os detalhes devem ser questionados: alimentação recente, padrão da dor, se houve náuseas, outros sintomas relacionados como disúria e até mesmo a presença de corrimentos, seja ele vaginal ou peniano. Em algumas situações queremos corroborar a hipótese diagnóstica de apendicite, porém alguns sintomas não relacionados nos auxiliaram a ficar atento para outros diagnósticos diferenciais.

Após a realização da anamnese se complementa com o exame físico, o qual possui alguma nuances que devem ser atentados. Não se pode estimular a dor, logo no início do exame clínico, uma vez que o paciente irá permanecer apreensivo e irá involuntariamente contrair o abdome, dificultando seu exame e até podendo chegar a achados alterados.

Um ponto bastante importante do exame físico realizado numa suspeita de apendicite é a realização da manobra de descompressão dolorosa. Esta manobra, não é tão simples. Durante sua execução o examinador pode involuntariamente apertar ainda mais o ponto de palpação, imediatamente antes de soltar, o que acarreta numa falsa interpretação de positividade do exame.  Pequenas alterações da tensão do músculo reto abdominal, não são facilmente palpáveis e a dedicação do exame físico pode ser crucial para encontrar este achado.

Existe uma gama de manobras que podem ser consideradas os sucedâneos da conhecida manobra de Blumberg no ponto de McBurney. É inviável sabermos a execução de todas as diferentes manobras, no entanto e especialmente nos casos de dúvida algumas manobras podem ser úteis para corroborar todo o raciocínio diagnóstico como as listadas a seguir.

  • Sinal de Blumberg: Dor à descompressão súbita no ponto de McBurney.
  • Sinal de Rovsing: Dor na fossa ilíaca direita à palpação da fossa ilíaca esquerda.
  • Palpação no cólon descendente desloca os gases para o cólon ascendente, atingindo o apêndice inflamado hipersensível, provocando dor.
  • Sinal de Lenander: Temperatura retal maior que a temperatura axilar em mais de 1º C.
  • Sinal de Dunphy: Dor na FID que piora com a tosse.
  • Sinal de Lapinsky: Dor à compressão da FID enquanto se eleva o membro inferior direito esticado. Presente no apêndice retrocecal.
  • Sinal de Aaron: Dor epigástrica referida à palpação do ponto de McBurney.
  • Sinal do Iliopsoas: Dor à extensão e abdução da coxa direita com o paciente em decúbito lateral esquerdo. Presente no apêndice retrocecal.
  • Sinal do Obturador: Dor hipogástrica à flexão e rotação interna do quadril. Presente no apêndice pélvico.

Próximo passo: solicitações de exames, sejam eles laboratoriais ou de imagens.

Num mundo ideal teríamos todos os exames e métodos gráficos disponíveis, no entanto, também devemos ser capazes de elaborar o  diagnóstico em situações adversas, onde temos apenas os métodos de análise clínicas. Esta situação não é muito frequente nos grandes centros, porém nas regiões de menor recursos é uma realidade ainda bastante presente.

Para quantificar os achados do exame clínico e agregar aos achados de exames de laboratório foram criados escores que definem as condutas a serem adotadas frente a um caso suspeito de apendicite aguda. Portanto, maior será a validade destes escores, quanto melhor for a história clínica e exame físico. Aplicar aleatoriamente um score para apendicite em pacientes com história não suspeita certamente terá um alto índice de falsos positivos. Dentre os testes clinicos/laboratorias para apendicite, o score de Alvarado certamente é o mais conhecido e com diversos estudos que validaram a sua utilização. Mais recentemente o score de reposta inflamatória da apendicite (AIR), também foi validado e comparado com os achados do score de Alvarado e apresentou resultados com acurácia ainda maior.

Escala de Alvarado 
* Na escala de Alvarado é considerado 75% ou mais de polimorfonucleares

  • 0-3: baixo risco:

Orientação para retorno se não melhora ou piora da clínica;
Probabilidade de apendicite aguda: 3,7% adultos e 1,9% em crianças;

  • 4-6: risco moderado:

Admissão para observação e reavaliação;
Se a pontuação continua a ser a mesma em 12 horas, indica-se cirurgia;
Se paciente do sexo feminino, considerar TC de abdome;
Probabilidade de apendicite aguda: 45% adultos e 12% em crianças

  • ≥ 7: alto risco:

Se paciente do sexo masculino, proceder à apendicectomia;
Se paciente do sexo feminino não grávida, indica-se laparoscopia diagnóstica ou TC de abdome;
Probabilidade de apendicite aguda: 87% adultos e 67% em crianças.

AIR 

Baixo: 0-4 pontos – acompanhamento ambulatorial, se condição inalterada;
Indeterminado: 5-8 pontos – observação hospitalar, exames seriados, imagem ou laparoscopia diagnóstica, de acordo com a prática local;

  • Alto: 9-12 pontos – exploração cirúrgica.

Mesmo tudo feito da forma mais correta, haverá um percentual de pacientes que encaixa no grupo indeterminado (risco moderado) e os próprios escores sugerem a complementação com exames de imagem e/ou observar em regime hospitalar.  É neste grupo que o médico, em um local com menos recurso, deverá dedicar mais atenção e até mesmo traçar uma conduta baseada na sua experiência e nos seus achados subjetivos e objetivos da anamnese e exame físico. Esta conduta pode até ser a transferência para local com mais recursos, observação ou a indicação cirúrgica.

Apesar do tratamento conservador da apendicite aguda ter ganhado um certo ímpeto recentemente, não existe nenhuma evidência clínica e/ou de estudos que comprovem o tratamento empírico em pacientes do grupo indeterminado. Todos os ensaios clínicos se basearam no diagnóstico tomográfico de apendicite aguda.  Não podemos extrapolar esses achados até o momento, e indicar antibioticoterapia em um diagnóstico indeterminado de apendicite aguda. Não confundir o não diagnóstico de apendicite com uma suspeita de sepse, onde mesmo que não se tenha descoberto a causa, o antibiótico deve ser iniciado imediatamente.

Para levar para casa 

O diagnóstico pode ser desafiador especialmente quando não possuímos recursos complementares. Os escores servem para auxiliar as nossas condutas e não podem ser utilizados como métodos definitivos. A maior validade destas escalas são os extremos onde resultados baixos ajudam na decisão de liberar o paciente e nos resultados altos que indicam uma abordagem mais enérgica.

 

 

 

Fonte: PEBMED

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