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O que se sabe sobre a Deltacron, variante que combina Ômicron e Delta

Na terça-feira (15/3), o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, confirmou a identificação dos dois primeiros casos da variante no Brasil

O surgimento de novas variantes do coronavírus é acompanhado com atenção pela comunidade científica global. Nas últimas semanas, pesquisadores relataram a identificação de uma linhagem que combina características genéticas duas outras cepas do SARS-CoV-2: a Ômicron e a Delta. A mistura das duas variantes tem sido chamada informalmente de Deltacron.

Até o momento, a variante foi identificada em poucas amostras, em países como França, Holanda e Dinamarca. Na terça-feira (15/3), o ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, confirmou a identificação dos dois primeiros casos no Brasil, nos estados do Amapá e Pará.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) realiza o monitoramento da Deltacron e informa que estudos sobre as características epidemiológicas da variante estão em andamento.

Especialistas consultados pela CNN explicam o que já se sabe e o que permanece incerto sobre a Deltacron.

Como acontece a combinação de duas variantes

Uma pessoa pode ser infectada ao mesmo tempo por duas linhagens diferentes do novo coronavírus. Casos de coinfecção já foram relatados anteriormente em diversos estudos científicos. Dentro do organismo humano, o vírus invade células com o objetivo de produzir inúmeras cópias de si mesmo.

O virologista Fernando Spilki, pesquisador da Universidade Feevale, do Rio Grande do Sul, explica que em um caso de coinfecção é possível que duas linhagens virais penetrem a mesma célula humana. Nesse momento, as enzimas utilizadas na replicação podem absorver informações genéticas das duas cepas envolvidas, gerando uma cópia viral mista, como no caso da Deltacron.

“A recombinação acontece quando dois genomas se encontram na mesma célula. Durante o processo de replicação, as enzimas que fazem a síntese de moléculas de RNA ‘filhas’ acabam utilizando genoma de Delta em um momento e genoma de Ômicron em outro como molde e acabam gerando um RNA na forma de mistura dos dois”, explica Spilki.

O genoma final, formado a partir da combinação, pode ou não ser capaz de se multiplicar e de gerar cópias idênticas de si mesmo.

“No caso da Deltacron, ela é praticamente todo o genoma de Delta com um fragmento que codifica a proteína Spike oriundo de Ômicron. Esse genoma foi viável, ou seja, consegue se multiplicar e gerar vírus capazes de passar de uma pessoa para outra, daí se estabelece uma nova variante”, completa.

O pesquisador José Eduardo Levi, da Universidade de São Paulo (USP), explica que a detecção de uma linhagem mista como a Deltacron pode ser feita a partir da análise do sequenciamento genômico do vírus.

Após o diagnóstico do vírus, os pesquisadores realizam o sequenciamento genômico da amostra, que permite identificar a linhagem envolvida e traçar a origem e circulação do vírus. As informações genéticas da análise são depositados em bancos de dados internacionais, como o Gisaid.

“Com a sequência genômica completa do vírus em mãos, rodamos em um programa que busca informações características de cada linhagem. Nesse momento, podem ser identificadas características que diferem da variante identificada em um primeiro momento, foi o que aconteceu. A Deltacron basicamente tem uma Spike de Ômicron e o resto de Delta”, afirma Levi.

Monitoramento

Desde o início da pandemia, a OMS recomenda que os países realizem a testagem e o sequenciamento genômico do coronavírus, com o objetivo de identificar com agilidade possíveis mutações virais.

A nova variante tem sido monitorada pela OMS. Em entrevista à imprensa, a diretora técnica da OMS, Maria Van Kerkhove, afirmou que foram identificados poucos casos no mundo até o momento.

“Estamos cientes dessa combinação. É uma combinação de Delta AY.4 e Ômicron BA.1. Foi detectada na França, na Holanda, na Dinamarca, mas há níveis muito baixos dessa detecção. O recombinante, em si, isso é algo que se espera, dada a quantidade intensa de circulação que vimos tanto com Ômicron quanto com Delta”, afirmou Maria à imprensa.

Características epidemiológicas

Diante da identificação de uma nova variante do coronavírus, cientistas em todo o mundo se mobilizam para identificar possíveis impactos da linhagem para as vacinas em uso e para os testes de diagnóstico, além das características clínicas como transmissibilidade e gravidade da doença.

Segundo a diretora técnica da OMS, os estudos sobre a Deltacron ainda estão em desenvolvimento.

“Não vimos nenhuma mudança na epidemiologia com este recombinante, não vimos nenhuma mudança na gravidade, mas há muitos estudos em andamento. A OMS está ciente disso por causa de nosso Grupo Técnico Consultivo para Evolução de Vírus, que se reúne regularmente desde junho de 2020 exatamente por esse motivo”, disse Maria.

O pesquisador Fernando Spilki também afirma que o entendimento das características principais da Deltacron depende de avanço nos estudos.

“Sobre a transmissibilidade, a virulência, se causa ou não doença mais grave e efeito para as vacinas, a resposta é que não sabemos ainda. Tudo está sendo investigado, até mesmo por que o número de casos é muito pequeno”, disse.

Para os especialistas, embora a variante tenha apresentado potencial de transmissão, não há motivo para alarme. “A variante não deveria mudar o nível de atenção que nós já deveríamos ter em relação ao manejo da pandemia. Já temos circulando ramificações de Ômicron, como a variante BA.2, causando novo aumento de casos”, disse Spilki.

“Do ponto de vista epidemiológico, não parece estar aumentando o número de casos. Além disso, não é esse tipo de recombinante que preocupa, mas sim aqueles entre vírus de espécies diferentes. Uma recombinação do vírus humano com o de rato, ou de humano com vírus do porco. São essas que provocam grandes mudanças no vírus e que podem fazer com que ele se torne mais patogênico”, completa Levi.

Atualização de vacinas

As vacinas desenvolvidas e em uso contra a Covid-19 no mundo têm como objetivo central a prevenção de doenças graves e mortes. De acordo com a OMS, os imunizantes atuais conferem altos níveis de proteção diante da infecção pela Ômicron.

As vacinas atuais são baseadas em cepas do vírus que circularam no início da pandemia, como as linhagens de Wuhan, na China. Desde então, houve uma evolução contínua e substancial do vírus que deve continuar resultando no surgimento de novas variantes.

O Grupo Técnico Consultivo sobre Composição da Vacina Covid-19 da OMS alerta que a composição das vacinas pode precisar de atualização, com o objetivo de manter a proteção contra doenças graves e mortes, garantindo a amplitude da resposta imune contra variantes circulantes e emergentes.

Neste momento, o grupo de trabalho da OMS incentiva os fabricantes de vacinas contra a Covid-19 a produzir e fornecer dados sobre o desempenho dos imunizantes atuais e em testes para variantes específicas, incluindo a amplitude, magnitude e durabilidade das vacinas.

 

 

Fonte: CNN Brasil

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